Posicionamento do Departamento de Nutrição SBD sobre o estudo que associapositivamente o consumo de Xilitol com doenças cardiovasculares

O artigo publicado no último dia 06 de junho de 2024 no periódico European Heart Journal com o título “Xylitol is prothrombotic and associated with cardiovascular risk” está causando muita polêmica porque associa o consumo de um adoçante natural com o risco cardiovascular1.

Primeiramente, vamos entender que adoçantes são substâncias que conferem sabor doce aos alimentos, enquanto edulcorantes são a matéria-prima dos adoçantes2.

Os edulcorantes podem ser classificados de acordo com sua origem (natural ou artificial/sintético) ou pela presença de calorias (calóricos ou não calóricos)2.

Os edulcorantes naturais são obtidos a partir de plantas ou de alimentos de origem animal, enquanto os edulcorantes artificiais/sintéticos são obtidos também de produtos naturais ou não, porém por meio de reações químicas. Os edulcorantes considerados naturais atualmente aprovados para o consumo são a estévia e a taumatina e os classificados como polióis (sorbitol, manitol, isomaltitol, maltitol, xilitol, eritritol e lactitol)2.

Os polióis são carboidratos de baixa digestão, ou seja, são digeridos de uma forma incompleta no intestino delgado e são parcialmente fermentados no intestino grosso. Por isso mesmo, quando consumidos em excesso, podem levar ao desenvolvimento de sintomas desagradáveis (ex: diarreia, flatulência, desconforto abdominal)3.

São obtidos de fontes naturais e formados por meio da hidrogenação de carboidratos derivados de frutas, cereais, vegetais e cogumelos, oferecendo baixo índice glicêmico (entre 0 e 52) e poucas calorias por grama (apenas 2,4 calorias/g, exceto o eritritol cujo valor calórico é zero) 2.

O xilitol e o eritritol são os polióis mais estudados e utilizados pela população, por serem utilizados em uma variedade de produtos alimentícios e de higiene bucal como substitutos do açúcar4.

Estudos com humanos e animais sobre os efeitos do uso de xilitol e eritritol, observaram diversas vantagens para indivíduos melhorar a saciedade (estímulo à liberação de hormônios sacietogênicos, por exemplo, colecistoquinina, retardando o esvaziamento gástrico e contribuindo para o prolongamento da saciedade; inibição das enzimas alfa-amilase e alfa-glicosidase, reduzindo a absorção de glicose no intestino delgado) e para reduzir o pico glicêmico pós-prandial (aumento da captação de glicose muscular pela modulação do Glut-4 e IRS-1)5-7.

Diante do exposto, as vantagens do uso do xilitol são inúmeras comparadas ao açúcar/sacarose e o Departamento de Nutrição da Sociedade Brasileira de Diabetes, observou a necessidade de esclarecimentos sobre o estudo primeiramente citado1 pelo seu impacto na saúde pública devido a seu amplo uso pela população.

O artigo “Xylitol is prothrombotic and associated with cardiovascular risk” foi dividido em três partes.

Na coorte foram avaliados durante três anos por exames bioquímicos um total de 2.149 indivíduos com idade entre 56 e 72 anos, excesso de peso corporal (IMC de 25,4 a 32,1) e alguns destes participantes relataram ter diagnóstico de diabetes tipo 2 (22%, hipertensão arterial (72%), histórico familiar de doença cardiovascular (72%), sendo que 14% ainda eram fumantes e usuários de medicação para doenças cardiovasculares (19% bloqueadores de canais de cálcio, 61% estatinas, 77% aspirina). Ressaltamos que não houve avaliação do controle alimentar por meio de registros dietéticos ou questionário de frequência alimentar semiquantitativo ou qualquer outro instrumento nutricional para avaliar a dose diária ingerida de xilitol ou de outros edulcorantes naturais e/ou artificiais, bem como a frequência de consumo de alimentos associados ao risco de doenças cardiovasculares (ex: ultraprocessados, embutidos, ricos em gorduras saturadas).

O estudo de intervenção onde foi observado a maior agregação plaquetária e risco de trombo, foi realizado com apenas 10 indivíduos com estas mesmas doenças crônicas citadas no estudo de coorte, sendo oferecida aos mesmos uma solução contendo 30g de xilitol dissolvidos em água, sem a presença de grupo controle (placebo).

Na terceira parte foi realizado estudo experimental com animais de laboratório onde foram realizadas injeções intravenosas de xilitol.

Em resumo, podemos afirmar que não houve um controle rígido tanto na coorte como no estudo clínico. Estudos em animais devem ser observados com cautela. Não podemos generalizar os resultados, porque é necessário considerar a forma de administração (soluções não refletem o consumo habitual e a dose oferecida (superior ou não a Ingestão diária aceitável). Também, não houve grupo controle apropriado e o recrutamento de voluntários não considerou condições de saúde específicas préestabelecidas (ex: excesso de peso corporal, esteatose, diabetes, tabagismo, doenças
cardiovasculares).Ademais os voluntários do estudo de coorte que relatam não consumir edulcorantes de outros tipos e alimentos ricos em gordura saturada, sódio entre outros, podem estar, inadvertidamente, expostos aos mesmos em produtos8.

Diante do exposto, como o uso de adoçantes pode beneficiar o controle glicêmico pós-prandial, ao contrário do açúcar simples/sacarose, especialmente em líquidos e bebidas adoçadas; seguimos na recomendação principal de que o consumo ocorra dentro das quantidades seguras, que são estimadas considerando o peso corporal, e que o tipo de adoçante seja escolhido de forma individualizada ou conforme indicado pelo
nutricionista ou outro profissional de saúde especialista no tratamento de pessoas com Diabetes.

REFERENCIAS:

  1. Witkowski M, et al. Xylitol is prothrombotic and associated with cardiovascular risk. Eur Heart J 2024: 00, 1–14.
  2. Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução-RDC nº 271, de 22 de setembro de 2005.
  3. Grabitske, Hollie A., and Joanne L. Slavin. Low-digestible carbohydrates in practice. J Am Diet Assoc 2008;108(10):1677-1681.
  4. Mooradian, A. D; Meridith S.; Masaaki T. The role of artificial and natural sweeteners in reducing the consumption of table sugar: A narrative review. Clin Nutr ESPEN 2017; 18:1-8
  5. Wölnerhanssen BK, Meyer-Gerspach AC, Beglinger C, Islam MS. Metabolic effects of the natural sweeteners xylitol and erythritol: A comprehensive review. Crit Rev Food Sci Nutr. 2020;60(12):1986-1998.
  6. Chukwuma, C, et al. Erythritol reduces small intestinal glucose absorption, increases muscle glucose uptake, improves glucose metabolic enzymes activities and increases expression of Glut-4 and IRS-1 in type 2 diabetic rats. Eur J Nutr 2018; 57: 2431-2444.
  7. Natah, S.S., et al. Metabolic response to lactitol and xylitol in healthy men. Am J Clin Nutr 1997;65(4): 947-950.
  8. Sylvetsky AC, Jin Y, Clark EJ, Welsh JA, Rother KI, Talegawkar, SA. Consumption of low-calorie sweeteners among children and adults in the United States. J Acad Nutr Diet 2017;117(1).

Departamento de Nutrição SBD 2024/2025

COORDENAÇÃO
Marlice Marques – Coordenadora
Daniela Gomes – Coordenadora
MEMBROS:
Amanda Araújo
Ana Carolina Almeida Rego
Conceição Chaves
Daniela Lopes Gomes
Débora Bohnen Guimarães
Débora Lopes Souto
Deise Regina Baptista
Letícia Fuganti Campos
Maristela Bassi Strufaldi
Paula Nonato Maia de Almeida
Sabrina Soares de Santana Sousa
Silvia Ramos
Tarcila Ferraz de Campos